Fonte
MÍDIA: jornal | VEÍCULO: Folha de São Paulo | DATA: 13/12/2003 | CADERNO: Folha Ilustrada | PÁGINA:
Temas
Violência e medo
Medo, comportamento e sociabilidade
Sensação de insegurança
Notícia
Livro que inspirou “Tiros em Columbine” traça um perfil da comercialização da paranóia. No livro “Cultura do Medo”, Barry Glassner, 48, chegou à conclusão de que a América vivia uma espécie de síndrome do pânico. Os americanos sofriam cada vez mais por motivos menos reais. As taxas de criminalidade caiam 20% e as notícias sobre violência cresciam 600%.
Publicado em 1999, o trabalho do professor da Universidade da Califórnia do Sul gerou polêmica nos EUA e acabou servindo de fio condutor para “Tiros em Columbine”, de Michael Moore.(…) As pesquisas minuciosas do sociólogo apontam como o medo é cultivado -em histerias coletivas provocadas em torno de histórias como as crianças atiradoras em colégios ou pretensas epidemias devastadoras da humanidade, o ebola- e que setores se beneficiam desse comércio do medo. (…) Os cultores do medo fariam com que “os problemas sérios continuem amplamente ignorados”: o desemprego, as desigualdades sociais ou os 75 milhões de americanos sem acesso ao sistema de saúde. A colheita das desgraças seria especialmente interessante para “políticos que ganham eleições em cima do discurso da solução do medo”, “segmentos da mídia”, “as diferentes indústrias da segurança” e “os advogados”, como explica Glassner.
Trechos entrevista: Folha – Quem são os grandes beneficiados do terror generalizado?
Glassner – São quatro grupos principais. Os políticos que ganham eleições em cima do discurso da solução do medo. Em segundo, alguns segmentos da mídia, sobretudo canais de TV locais e redes de notícia 24 horas. Depois as diferentes indústrias da segurança. Por fim, os advogados.
Folha – O medo exagerado não é totalmente novo. Um dos exemplos é a paranóia atômica durante os anos de Guerra Fria. O sr. saberia dizer quando a “cultura do medo” começou a ser semeada?
Glassner – O comércio do medo aconteceu em vários momentos da história. Mas o que chamo de “cultura do medo” é algo bem mais recente. Por ela entendo um ambiente de bombardeamento ininterrupto de notícias estimulantes do medo exagerado. No passado isso era localizado. Agora é o tempo todo. Se você vai a uma estrada, vê outdoors de sabonetes antibacterianos. Campanhas políticas também são assim. Antes vendiam esperança e progresso, hoje se apóiam no medo.
É difícil dizer quando isso começou, mas o surgimento das TVs a cabo foi importante. Antes a pessoa podia ler uma história assustadora no jornal, pela manhã, mas só voltava a pensar nisso no dia seguinte. Agora é 24 horas.