Junho de 2007 – Revista Arquitetura e Urbanismo
AU nº 159 – pgs. 18 e 19
Grades, muros, cercas elétricas e a proliferação de condomínios fechados são algumas das interferências que o medo da violência provoca na paisagem urbana. Mas de que forma a arquitetura e o urbanismo interferem nessa violência? É possível minimizar o problema simplesmente com a implementação de conceitos arquitetônicos e urbanísticos específicos? Independentemente da resposta, existe um consenso entre os profissionais da área de que os atuais recursos espaciais de segurança – ainda que bem intencionados – só contribuem para perpetuar o problema. Um primeiro e importante passo para diminuir a violência seria usar a arquitetura e o urbanismo para intensificar a vivência urbana, diminuir a segregação espacial e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. AU conversou com arquitetos, políticos e sociólogos para saber se, afinal, a arquitetura e o urbanismo podem contribuir para a diminuição da violência
A sociedade na Idade Média construía as muralhas e fossos ao redor das fortalezas para se proteger do inimigo. Os muros altos que circundam nossas casas e condomínios não são diferentes: nos isolam da rua, do passeio, da praça e da cidade – que acabam sendo propriedades de ninguém e, desta forma, marginais e violentas. Além dos muros altos, são exemplos da decadência urbana o crescente número de condomínios fechados e os sofisticados sistemas de segurança. Mas, quando permitimos a abertura das janelas das nossas casas à rua – os ‘olhos da cidade’ – estamos compartilhando o espaço com toda a sociedade, deixando o isolamento e enfrentando em parceria os bons e maus momentos.
Silvio Parucker,
arquiteto e coordenador do curso de arquitetura
e urbanismo da Universidade Federal do Paraná


Sim. Exemplo disso são os projetos de intervenção social e revitalização de áreas públicas de lazer e cultura que resgatam a identidade cultural de uma determinada comunidade, incentivando a sua ocupação e preservação e, dessa forma, elevando a sensação de segurança. O restauro e a reconversão de uso de sítios urbanos e monumentos históricos também contribuem para o desenvolvimento econômico do entorno, impulsionando o turismo e elevando a qualidade de vida das populações envolvidas. O poder público tem apostado nessa estratégia, pois as ações privadas e fragmentadas de proteção (muros, grades, câmeras etc.) aumentam a segregação social e são ineficazes na diminuição da violência.
Bruna Charifker,
arquiteta e socióloga do Núcleo de
Estudos da Violência (NEV) da USP


Sim. Ruas sem vida são inseguras. Jane Jacobs já dizia que a segurança dos espaços urbanos é favorecida pelos ‘olhos da rua’, ou seja, pela quantidade de pessoas – comerciantes e residentes – que freqüentam dia e noite um local. Nesse sentido, o zoneamento monofuncional, típico do urbanismo modernista, oferece menos segurança do que o tradicional, que privilegia a diversidade de uso. Edifícios colados uns aos outros, no alinhamento da rua e com lojas no térreo, a exemplo dos da avenida Atlântida, na capital carioca, permitem um maior controle da comunidade sobre o espaço público do que os isolados, sobre pilotis, que criam uma zona ambígua: não se sabe o que é público e o que é privado.
Luiz Paulo Conde,
arquiteto e secretário de Estado de Cultura do Rio de Janeiro


Acredito que não podem contribuir para diminuir a violência e o medo que contaminam a vida urbana, sendo também incapazes de absorver formas de proteção que contribuam para a segurança coletiva e individual. Talvez só sejam capazes de promover a ‘sensação’ de segurança. A intensificação das representações simbólicas da violência, do medo e da proteção, com os autoconfinamentos e auto-aprisionamentos residenciais, certamente só contribui para potencializar a crise de sociabilidade e as oposições de classes. As responsabilidades social, ética e profissional dos arquitetos e urbanistas deveriam ser orientadas para a construção coletiva e multidisciplinar de uma sociedade culta, próspera, igualitária e, conseqüentemente, menos violenta e mais segura.
Sonia Maria Taddei Ferraz,
arquiteta e professora de arquitetura da Universidade Federal
Fluminense, coordenadora da pesquisa Arquitetura da Violência


Espaços seguros e democráticos são essenciais para a promoção da segurança pública e prevenção da violência. Nesse sentido, a arquitetura e o urbanismo ganham importância central. Uma forma eficiente para reduzir a criminalidade é incentivar os governos locais e seus parceiros a investirem em melhorias urbanas e projetos arquitetônicos. Mas só isso não basta: é preciso realizar um amplo trabalho com a comunidade, de modo a envolvê-la na execução desses projetos e na discussão sobre os espaços públicos. Dessa forma, as melhorias serão legítimas, respeitadas e cuidadas pela comunidade, que passará a usar de fato o espaço, tornando-o seguro e de convivência pacífica.
Carolina de Mattos Ricardo,
coordenadora do Programa São Paulo
em Paz, do Instituto Sou da Paz

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