Muitos moradores do bairro não conhecem o centro do Rio de Janeiro
Publicado em 12 de dezembro de 2007 – Jornal O Estado do Rio de Janeiro
Por João Paulo Gondim
Anunciados, há mais de duas décadas, em propagandas imobiliárias como verdadeiras ilhas de conforto e segurança, os condomínios da Barra da Tijuca produziram um fenômeno curioso: uma geração de jovens moradores que não conhece o Centro do Rio de Janeiro.
“Posso contar nas mãos (ou quem sabe em só uma delas) quantas vezes já fui ao Centro. Eu nem sei chegar até lá. Ficar por aqui é mais cômodo, mais fácil e menos perigoso”, revela a universitária Jéssica Chagas, moradora do condomínio Santa Mônica.
Foto: Banco de Imagens
A falta de intimidade com o Centro por pouco não comprometeu sua participação na campanha “Papai Noel dos Correios”, que distribui presentes de Natal às crianças carentes. Ao saber que teria que pega uma carta na sede da empresa, na Avenida Presidente Vargas, quase desistiu da boa ação.
Vizinha de Jéssica, Elizabeth Lima até arrisca ir à Zona Sul para se divertir, porém se sente mais protegida nos arredores de casa. “Às vezes vou a alguns bares em Botafogo, mas quase sempre fico na Barra mesmo, por causa da violência. Tenho medo de ser abordada nas favelas”, conta.
Elizabeth apresenta outros motivos, além da sensação de segurança, que levam seus amigos a não saírem do bairro. Para ela, pelo simples fato de haver os serviços necessários, perto ou dentro dos próprios condomínios, seus amigos não precisam resolver problemas no Centro. Isso explica o desconhecimento de muitos deles em relação a lugares históricos da cidade, como Central do Brasil, Rua do Ouvidor e Saara.
Tal justificativa é endossada por Felipe Villela, pesquisador da professora Sonia Ferraz, da Universidade Federal Fluminense (UFF), no projeto “Arquitetura da Violência”. Em seus estudos, Villela, que também mora em um condomínio da Barra, analisa de que modo a violência provoca mudanças nos modelos arquitetônicos e urbanísticos da cidade.
“Na Barra, a pessoa pode viver literalmente entre muros. Ela vai de sua casa, em um condomínio, até a universidade, passando por outros condomínios”, assegura Villela. De acordo com o pesquisador, apesar de cada vez mais os prédios se assemelharem a castelos da Idade Média, ninguém está a salvo de agressões, que podem vir de fora (assaltantes), como de dentro (os próprios vizinhos).
O estudioso conta que a oferta de serviços vem desde os primeiros condomínios, como mecanismo de valorização do mercado imobiliário, e forma de justificar as construções naquela área. Villela, que declara ser “totalmente contra” o modelo de ocupação da Barra da Tijuca, lamenta que muito dos seus amigos fiquem confinados em um universo espacial reduzido.
Porém, o pesquisador não precisam ficar totalmente desencantado. Suas críticas parecem ter sido ouvidas por Jéssica e Elizabeth, que, embora freqüentem os mesmos lugares de sempre, estão cientes de que há vida além dos muros do condomínio, e planejam desfrutar dos encantos da cidade em que moram.
“Gostaria de explorar mais a minha cidade, seria legal conhecê-la melhor“, aposta Jéssica, acompanhada do entusiasmo da amiga. “O Rio é lindo! Tem milhões de coisas a oferecer!”, completa Elizabeth.
Disponível no site: http://www.oestadorj.com.br/?pg=noticia&id=895 – Consultado em: Quarta-Feira, 09 de Abril de 2008